segunda-feira, 26 de novembro de 2012

Cavalo-marinho (Chão nosso de cada dia)

Eu e ela sempre rimos a toa e por horas! Tudo começa com um sorriso dela, após uma palhaçada minha. Ao ver seus belos dentes, contrastando com seus lábios vermelho-maça-do-amor, em sua boca escancarada de euforia, quase que de forma involuntária, a minha também se abre. A alegria contagia! Afinal, o sorriso acalma, é a arma que desarma a alma. Coloco as mãos em minha barriga, a esquerda vem primeiro, a direita por cima, rapidamente. Deixo o ar fluir em meus pulmões, como uma montanha-russa cortando o vento! Inclino-me para trás, olho para cima e depois fecho os olhos, apertando as pálpebras. Quando volto, dou de cara com ela que, jogada no sofá, em posição fetal, gira de cá pra lá, abraçada com uma das almofadas que, nessa hora faz o papel de ursinho de pelúcia, ganho no tiro ao alvo. Ela acaba chorando com tantas gargalhadas! A gente pára por um instante, meu maxilar está dolorido e ela diz que sua barriga também dói: “Aquela dorzinha aguda, sabe”? Depois que falo um sonoro “aí... aí... morena”, tentamos retornar ao papo, mas, não lembramos onde havíamos parado. Olho em seus olhos, seu ar é de graça! Ela relaxa os ombros e rimos novamente. De novo estamos ali, a gente, naquela atmosfera toda, repleta de harmonia e felicidade, cíclica como uma roda gigante e tão doce como algodão-doce. Eu lírico, ela leve! A gente sabe quando começa e nunca sabemos como parar, pois, não queremos que pare. O riso é nosso alicerce, tão importante quanto nosso amor e as macarronadas de domingo. Tudo começa com um sorriso dela, após uma palhaçada minha.

quinta-feira, 18 de outubro de 2012

Meu Lado da Cama

Recém casados, Wagner e Beth entraram em um grande dilema. Sequer haviam imaginado algo do tipo: Escolher o lado da cama! Lógico, eles já haviam dormido juntos. Desde a segunda viagem que fizeram. Wagner e Beth já dividiam o mesmo cantinho, seja numa barraca de camping ou colchonetes em viagens com amigos (disse segunda viagem, pois, a primeira estrada foi em uma caravana na fase "zen" de Beth, não puderam dormir juntos. Wagner embarcou numa grande roubada - pelo menos pra ele - tendo que segurar seu temperamento inquieto e entrar na onda do “Ooouunnn” de Beth. Cada qual no seu lado, sem poder aproveitar a linda e inspiradora vista paradisíaca do vilarejo). Mas, agora é bem diferente, a história é outra, são outros quinhentos.

Como disse Beth: “Essa nossa escolha precisa ser muito, mas, muito bem pensada! Passaremos o resto de nossas vidas desse ou daquele lado...". Se pensarmos bem, Beth tem razão. Porém, não é isso que Wagner acha. Ele acredita que o lado pode ser mudado a qualquer hora. Bem, a partir de então, começaram a pensar em possíveis soluções: “Nessa primeira semana, dormiremos num esquema de revezamento, dia sim, dia não"! Disse Beth.
Essa tentativa teve êxito nas primeiras horas da noite, pois, ambos se sentiam incomodados em saber que aquilo era algo provisório. Pareciam que, de forma inconsciente, estavam com medo de se apegar ao lado atual e o outro, de repente, querer trocar. Mas, esqueciam que era, justamente, esse o intuito, se A-PE-GAR. Assim, buscaram sem cessar, novas formas de resolver esta questão.

Entre trocas de travesseiros, viradas de colchões, mudanças no leiaute do quarto, Beth teve um insight: “Que tal comprarmos um beliche!? Explanou, com a mesma cara que fez Cabral, quando descobriu que o novo era velho.
Wagner, é claro, achou um absurdo, não concordou com tal proposta e chegou a abrir um uísque, para ajudar engolir tamanha sugestão. Ela justificou, dizendo que ambos precisavam radicalizar, pois, há dias que procuravam o lado ideal da cama e nada de achar: “A proposta é uma pausa ao desgaste”! Ela disse. (Na minha opinião – que Wagner e Beth não me ouça – essa ideia era uma forma desesperada de emanar carência. Assim, os dois entenderiam de forma involuntária que o lado pouco importa, pois, o que vale não é “O” lado e sim “AO” lado. Mas, como diz meu velho bordão: “Em briga de cão e gato, não se atira o sapato”...).

Com muito custo e algumas doses, Wagner concordou com o monstro chamado beliche. Beth, antes que ele repensasse de sua louca decisão em concordar com ela, apanhou a chave do carro e correu para uma loja de moveis. Nessa noite, pela primeira vez, Wagner dormiu no sofá. Enquanto Beth, na volta, se aconchegou no colchão inflável jogado no corredor.

No dia seguinte, as onze em ponto, o beliche foi entregue. O dia se arrastou, ambos ansiosos aguardando a noite cair para dormir em paz e acordar relaxados. Nessa noite, Beth não cozinhou, pediu uma pizza e esperou Wagner chegar. As dezesete horas, já estavam de pijama, esperando um do outro o convite: “Vamos dormir”!?

Assistindo tevê, por volta das vinte e uma horas, se olharam ao mesmo tempo e disseram que estavam com sono, rindo, foram para o quarto. Avistaram o beliche, se contemplaram “aliviados” pela decisão brilhante que tomaram e, rapidamente, começaram a descer os edredons e lençóis do alto do guarda-roupas. Foi quando que, em um surto quase psicótico, Beth gritou: “Eu fico com a cama de baixo”!  E, assim, mais uma noite de indecisões e idéias com futuras frustrações se adentrou na vida deles.

terça-feira, 22 de maio de 2012

Passaporte (Sonhei que dormia na Opera)

A sonata te ata. Seus gestos, a fuga. Sua fúria, libertação. O pranto, catarse de intensa tensão. Fugaz foi seu desejo em melhora. Agora, esquece o que lhe padece, coagido em sua ardente libido. Em sua mente, suavemente, amor. Em plena noite quente, na agonia do calor, disse que era dia. Com alegria ou sorte, jogando xadrez com a morte.

terça-feira, 1 de maio de 2012

Mendigo-a-dois

Do pau-de-arara a ilusão da capital. Trabalhou em firma boa, mas, após a grande greve, um canteiro de obras foi a solução. Sem estudos, agora mora na rua da amargura, s/n. Junta lata, faz carreto, sem careta, junta tudo, só pra beber, comer algumas sobras e fumar igual Caipora. 

Um dia desses, uma madame quis fazer grande gesto, lhe deu um troco gordo. Logo pensou numa marmitex caprichada e numa garrafa de cachaça: “Brigadão, senhora! Hoje peço um prato executivo, só assim pra me sentir doutor”. Ela achou graça, sorriu um sorriso amarelo-dourado. Ele, educadamente, retribuiu com seu sorriso amarelo-apodrecido.

Partiu até o velho restaurante por quilo, pediu pra viagem e, bem humorado, brincou: “Por favor! Marmita gigante e branquinha da boa. Será a segunda melhor viagem de minha vida... Pois, da primeira não abro mão, será meu regresso pro sertão”! 

Pegou seu pedido e foi pra escadaria, longe da grande maioria, se preparou para o esperado desjejum. Mas, como bom temente a Deus, antes da primeira colherada, colocou a comida no colo e ergueu suas mãos, dizendo: “Brigado, Deus nosso-senhô! Sei que essa marmita dá pra dois, porém, minha fome é do tamanho do meu desapontamento e, mesmo sem cabimento, te agradeço, mas, não te ofereço. Amém”!

sexta-feira, 27 de abril de 2012

Bela Augusta!

Embaixo da terra, no atalho de ferro, entre vidros e emoções, vejo o mundo pela raiz, no pulsar das canções. Cortando o caminho do caos, olhando para cima, imaginando carros, rios podres e pessoas infelizes. No metrô, lendo Nietzsche, minha consolação para dias tristes, a morte de minha tragédia, uma fuga em páginas cheirando mofo e tinta velha. 

Salto na seguinte estação, caminhos para perdição, apressado para minha consolação. Afinal, a noite já vive! Quero música, quero gente, rock ou samba, meu paraíso intimo, sentir meus pulmões trabalhando e minhas pernas bambas. Quero sair derrotado, agitado, quero mais uma dose, por gentileza. Subir na mesa! 

Seguro na mão do amor próprio. Somos cúmplices, triviais, correndo feito idiotas, contra o cais. Ultrapassando todas as linhas, indo de ponta a ponta. Da burguesia a ponta podre, da alegria a azia. Juntando tudo e queimando-as livremente, inconsequente, seguindo o ritmo do meu coração. O dia chega e, no contra fluxo da rotina, já sem emoção, fecho a cortina, pois, meus olhos são boêmios, habituados com a escuridão.

segunda-feira, 12 de março de 2012

O bastão do temor

A vitoria causa medo, seja no individuo único ou em uma grande equipe com o mesmo objetivo. O surto do medo opera de forma silenciosa, explode como dinamite, quase que inevitável, em um momento exclusivo, no ápice, na hora em que a confiança cria uma pequena fenda. E, é nessa brecha que o medo se encaixa e ganha força, ali naquele pequeno espaço o medo cresce e se alimenta, tornando a luta intima e particular. Por exemplo, um corredor que está na liderança, seja de atletismo, bicicleta, moto ou piloto de automobilismo, passa a corrida inteira sem que o medo lhe atinja. Preocupa-se e foca em seu rendimento, busca prever alguns possíveis fatos repentinos, corrigindo detalhes e esperando a hora do triunfo. Só que ele se depara com a ultima volta e, é neste momento, nessa ultima curva, que um alarme dentro de sua mente ecoa. Basta visualizar a linha de chegada para titubear. Agora a luta não dura horas e não é mais contra outros competidores. A partir desse momento ele está lutando para não olhar pra trás, temendo alguma ultrapassagem, colocando em duvida sua capacidade, seu foco oscila, a boca seca e as mãos transpiram. Até cruzar a linha de chegada, seu companheiro maior é o “se”. Só que, quando a faixa bate no peito ou quando avista a bandeira flamulando no alto, ele desaba. Em frações de segundo o medo vira gloria, o esforço se torna mérito e sua honra é lavada de suor, sangue e vitoria. Quando pára e observa seu feito, como se estivesse fora dele, enxerga que só na ultima volta se tornou um corredor. Só quando colocou em duvida sua capacidade percebeu que, para ser um vencedor, não deveria subestimar os fatores externos, tampouco os internos e que sua consagração não era à base do esmo. E, só quando temeu a derrota, pode preparar seu paladar para deliciar-se com a vitoria, se tornando merecedor de si mesmo.