terça-feira, 22 de maio de 2012

Passaporte (Sonhei que dormia na Opera)

A sonata te ata. Seus gestos, a fuga. Sua fúria, libertação. O pranto, catarse de intensa tensão. Fugaz foi seu desejo em melhora. Agora, esquece o que lhe padece, coagido em sua ardente libido. Em sua mente, suavemente, amor. Em plena noite quente, na agonia do calor, disse que era dia. Com alegria ou sorte, jogando xadrez com a morte.

terça-feira, 1 de maio de 2012

Mendigo-a-dois

Do pau-de-arara a ilusão da capital. Trabalhou em firma boa, mas, após a grande greve, um canteiro de obras foi a solução. Sem estudos, agora mora na rua da amargura, s/n. Junta lata, faz carreto, sem careta, junta tudo, só pra beber, comer algumas sobras e fumar igual Caipora. 

Um dia desses, uma madame quis fazer grande gesto, lhe deu um troco gordo. Logo pensou numa marmitex caprichada e numa garrafa de cachaça: “Brigadão, senhora! Hoje peço um prato executivo, só assim pra me sentir doutor”. Ela achou graça, sorriu um sorriso amarelo-dourado. Ele, educadamente, retribuiu com seu sorriso amarelo-apodrecido.

Partiu até o velho restaurante por quilo, pediu pra viagem e, bem humorado, brincou: “Por favor! Marmita gigante e branquinha da boa. Será a segunda melhor viagem de minha vida... Pois, da primeira não abro mão, será meu regresso pro sertão”! 

Pegou seu pedido e foi pra escadaria, longe da grande maioria, se preparou para o esperado desjejum. Mas, como bom temente a Deus, antes da primeira colherada, colocou a comida no colo e ergueu suas mãos, dizendo: “Brigado, Deus nosso-senhô! Sei que essa marmita dá pra dois, porém, minha fome é do tamanho do meu desapontamento e, mesmo sem cabimento, te agradeço, mas, não te ofereço. Amém”!