sexta-feira, 28 de dezembro de 2007

Filosofia de botequim - Parte III – O Fulano.

Ficarei disfarçado até descobrirem quem sou. Por enquanto serei o cigano na avenida. A criança no farol. O dono do bar da esquina. O pedinte com a ferida exposta. Serei o carteiro de seu bairro. Ou até, aquele que esbarra em você na multidão. Sou quem lhe dá o assento no ônibus. Serei a mulher que lhe vende balas-de-goma na estação. Posso até ser o cego, o mendigo, o aleijado.

Baterei palma no seu portão para pregar uma religião. Serei o bêbado que gritará na calçada para chamar a atenção. Tocarei sua campainha, sairei correndo. Venderei pamonha, queijo-de-minas, trocarei bateria-de-carro usada por maçã-do-amor.

Serei o gari que varre o centro da sua cidade. Serei o tal “bigode”, o conhecido “chefia”, daquele restaurante. O porteiro do seu prédio. Passarei de moto toda madrugada, em frente sua casa, tocando um sinal de alerta. Chamo-lhe pelo nome, mas ao atender sua porta, não estarei lá. Quem eu sou? Qual meu nome? Será Zé? João? Maria? Mané? Você sabe quem eu sou, mas não me conhece. Você votou em mim na ultima eleição.

Eu sou você quando não sou eu e quando sou eu, você não me reconhece. Sou o acaso, o outro, o ladrão. Alguém que lhe ajuda com as sacolas. Lhe passo troco no guichê, você não me nota. Eu cuspo do alto da sacada. Vendo-lhe o jornal. Monto seus moveis. Conserto sua casa. Freqüento sua igreja, lhe dou a paz, mas ao passar do meu lado, você diz: - “Conheço esse rapaz?”

Quando você me notar, não se lembrará do meu nome e nem de onde me conhece. Sou seu vizinho chato, o motorista de taxi. Ah! Vê se me esquece. Não sou ninguém importante, sou um mero ambulante. No filme que você for protagonista, serei um figurante, quisá, um coadjuvante.

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